Ultimamente a situação tem andado bastante delicada aqui por essas bandas bolivianas, ainda mais quando se vive em La Paz, ainda mais quando se vive a 100 metros do palácio do governo.
Antes de qualquer coisa, é preciso dizer que na Bolívia o buraco é muito mais embaixo quando se trata de política. Aqui este assunto é discutido nos bares, nas casas ou em qualquer lugar, com ardor igual ao de um fla-flu. É normal andar pela rua quando meia dúzia de pessoas, munidas de cartazes e muita revolta, bloqueiam uma avenida e começam a se manifestar, e em alguns minutos outras pessoas se juntam com cartazes improvisados e dão coro ao movimento improvisado. Em menos de 15 minutos, o movimento de apenas 6 pessoas chega a atingir quase 100, no mínimo. Pra quem se acostumou a ficar esperto pra não tomar porrada nos movimentos estudantis no Brasil, foi uma boa surpresa ver que a polícia reagia pacificamente a tudo isso. O grande problema é que as revoltas aqui são tão comuns que o pessoal já meio que se acostumou, e apenas dizem “Ih, mais uma vez pararam a avenida...” e voltam à rotina sem dar muita importância ao que passa.
Pois é, agora coloquem nesse cenário uma série de polêmicas políticas e sociais culminando de uma só vez em um país. A nova constituição foi aprovada (com pontos muito polêmicos) ao mesmo tempo em que outros estados declaram autonomia do governo, com o agravante das tensões acerca da troca de capital de La Paz para Sucre. Junte a isso uma intensa divisão entre brancos e índios, ou índios entre índios, ou altiplano e oriente...enfim, sobram divisões em terras historicamente carentes de unidade. A unidade, como normalmente na América Latina, é imposta pela lei do mais forte ou, mais comumente, do mais rico. A grande questão é quando o povo descobre que não necessariamente as coisas precisam funcionar dessa maneira, e aí o bicho começa a pegar...
De vez em quando aparecem algumas pedras misteriosas que ninguém sabe de onde vem, algumas vezes elas alcançam vidraças, outras vezes pedestres. Por via das dúvidas, a ordem por aqui é de não andar de bobeira pela cidade. O chefe das forças armadas nos pede pra estocar alimentos em grande escala, pois os militares podem intervir não exatamante de forma amigável em caso de revoltas populares. Neste sábado, os mercados estavam cheios de donas de casa comprando todo tipo de coisa, como os americanos que a gente vê na TV quando sabem que um furacão está por vir. Nítido por aqui é que o povo não está de brincadeira, por mais que se fragmente em múltiplas direções.
Começo a pensar um pouco mais seriamente sobre a desorganização da esquerda latino americana. Sobram revoltas e pessoas fortes, falta a organização necessária para que todos gritem em uma só voz. Enquanto toda a direita se une em prol do simples motivo de ganhar mais dinheiro a qualquer custo, vejo uma esquerda fragmentada entre muitas bandeiras, cujos valores são tão grandes quanto suas divisoes. No dia em que os movimentos sociais se unirem sob uma bandeira, poderemos finalmente obter algo definitivamente expressivo política e socialmente.
No meio de toda esta tensão louca está o povo, por vezes ativo e por vezes espectador, porém sempre o mais afetado nestas loucas batalhas de poucos. Os políticos defendem interesses próprios disfarçados de causas populares, o que arrebata uma imensa quantidade de seguidores que apenas são utilizados como massa de manobra. A regra de ouro aqui na Bolívia é encontrar um povo extremamente trabalhador, honesto e disposto a fazer algo de útil por seu país, porém ingênuo ao ponto de acreditar no que alguns “bons samaritanos” lhes dizem em interesse próprio.
Não sou um especialista político e já aposentei minha carreira jornalística, apenas tenho vivido e analisado as coisas como qualquer pessoa por aqui. Vale a pena procurar mais a respeito das tensões na Bolívia, já que a imprensa brasileira praticamente ignora o que aqui parece uma questão de relevância capital. Sugiro que busquem os materiais publicados por uma jornalista chamada Sue Iamamoto, que estão bem fiéis ao que está passando e escritos de acordo com a ótica do camponês boliviano, quase nunca ouvido pelos meios de massa. Ela disse que faria um blog com isso tudo, mas por via das dúvidas utilizem o grande google que tudo pode e tudo vê. Rs
Repenso muito sobre estas questões políticas, e começo a pensar que as coisas realmente podem ser de outro jeito... Já há pessoas dispostas a mudar as coisas, assim como força de vontade para tal. O que falta é reinventar o meio para atingir isso...
Antes de qualquer coisa, é preciso dizer que na Bolívia o buraco é muito mais embaixo quando se trata de política. Aqui este assunto é discutido nos bares, nas casas ou em qualquer lugar, com ardor igual ao de um fla-flu. É normal andar pela rua quando meia dúzia de pessoas, munidas de cartazes e muita revolta, bloqueiam uma avenida e começam a se manifestar, e em alguns minutos outras pessoas se juntam com cartazes improvisados e dão coro ao movimento improvisado. Em menos de 15 minutos, o movimento de apenas 6 pessoas chega a atingir quase 100, no mínimo. Pra quem se acostumou a ficar esperto pra não tomar porrada nos movimentos estudantis no Brasil, foi uma boa surpresa ver que a polícia reagia pacificamente a tudo isso. O grande problema é que as revoltas aqui são tão comuns que o pessoal já meio que se acostumou, e apenas dizem “Ih, mais uma vez pararam a avenida...” e voltam à rotina sem dar muita importância ao que passa.
Pois é, agora coloquem nesse cenário uma série de polêmicas políticas e sociais culminando de uma só vez em um país. A nova constituição foi aprovada (com pontos muito polêmicos) ao mesmo tempo em que outros estados declaram autonomia do governo, com o agravante das tensões acerca da troca de capital de La Paz para Sucre. Junte a isso uma intensa divisão entre brancos e índios, ou índios entre índios, ou altiplano e oriente...enfim, sobram divisões em terras historicamente carentes de unidade. A unidade, como normalmente na América Latina, é imposta pela lei do mais forte ou, mais comumente, do mais rico. A grande questão é quando o povo descobre que não necessariamente as coisas precisam funcionar dessa maneira, e aí o bicho começa a pegar...
De vez em quando aparecem algumas pedras misteriosas que ninguém sabe de onde vem, algumas vezes elas alcançam vidraças, outras vezes pedestres. Por via das dúvidas, a ordem por aqui é de não andar de bobeira pela cidade. O chefe das forças armadas nos pede pra estocar alimentos em grande escala, pois os militares podem intervir não exatamante de forma amigável em caso de revoltas populares. Neste sábado, os mercados estavam cheios de donas de casa comprando todo tipo de coisa, como os americanos que a gente vê na TV quando sabem que um furacão está por vir. Nítido por aqui é que o povo não está de brincadeira, por mais que se fragmente em múltiplas direções.
Começo a pensar um pouco mais seriamente sobre a desorganização da esquerda latino americana. Sobram revoltas e pessoas fortes, falta a organização necessária para que todos gritem em uma só voz. Enquanto toda a direita se une em prol do simples motivo de ganhar mais dinheiro a qualquer custo, vejo uma esquerda fragmentada entre muitas bandeiras, cujos valores são tão grandes quanto suas divisoes. No dia em que os movimentos sociais se unirem sob uma bandeira, poderemos finalmente obter algo definitivamente expressivo política e socialmente.
No meio de toda esta tensão louca está o povo, por vezes ativo e por vezes espectador, porém sempre o mais afetado nestas loucas batalhas de poucos. Os políticos defendem interesses próprios disfarçados de causas populares, o que arrebata uma imensa quantidade de seguidores que apenas são utilizados como massa de manobra. A regra de ouro aqui na Bolívia é encontrar um povo extremamente trabalhador, honesto e disposto a fazer algo de útil por seu país, porém ingênuo ao ponto de acreditar no que alguns “bons samaritanos” lhes dizem em interesse próprio.
Não sou um especialista político e já aposentei minha carreira jornalística, apenas tenho vivido e analisado as coisas como qualquer pessoa por aqui. Vale a pena procurar mais a respeito das tensões na Bolívia, já que a imprensa brasileira praticamente ignora o que aqui parece uma questão de relevância capital. Sugiro que busquem os materiais publicados por uma jornalista chamada Sue Iamamoto, que estão bem fiéis ao que está passando e escritos de acordo com a ótica do camponês boliviano, quase nunca ouvido pelos meios de massa. Ela disse que faria um blog com isso tudo, mas por via das dúvidas utilizem o grande google que tudo pode e tudo vê. Rs
Repenso muito sobre estas questões políticas, e começo a pensar que as coisas realmente podem ser de outro jeito... Já há pessoas dispostas a mudar as coisas, assim como força de vontade para tal. O que falta é reinventar o meio para atingir isso...