quarta-feira, 21 de novembro de 2007

Pelo retrovisor


Aprendi com o tempo que seguir em frente é algo muito intenso e exige muito foco, por isso nem sempre sobra tempo para olhar pra trás. Na verdade, é menos uma questão de tempo e mais uma questão de medo de ver tudo o que eu deixei, pra no final das contas não agüentar a saudade e voltar...

Hoje tomei coragem e olhei pra trás. Vi uma namorada que me amava e que não mais espera minha volta, amigos de uma vida dizendo que sempre estarão do meu lado, minha mãe escondendo o choro pra não me deixar triste, meu pai machão que não aguentou e chorou, gente que eu mal falava dizendo o quanto se importava comigo. Vejo sorrisos, lágrimas, palavras, silêncios, pessoas que vejo dobrando a esquina sabendo que não as verei por um longo tempo. Olho pra trás e silenciosamente choro, vendo que agora a solidão não é mais uma escolha.

Recordo-me do momento de minha primeira girada de pedal, quando olhava para trás e via cada vez mais minha mãe e minha então namorada se distanciando aos poucos. Sentia vontade de voltar enquanto dava tempo, apenas para dar mais um abraço nas duas mulheres de minha vida, para então seguir em frente mais uma vez. Pensei que eu faria isso repetidamente por dias a fio, por isso apenas virei a cabeça em direção à estrada e pedalei juntando toda a coragem que tinha. Pedalei e chorei, como talvez jamais tenha chorado em toda a minha vida. No primeiro dia a saudade foi insuportável, na primeira semana também, mas depois a mente se educa e apenas olha pra frente.

Como disse em minha última mensagem neste blog, muita gente tem visto em mim um exemplo de força e etc, e escrevo isso agora também para mostrar o quanto posso ser fraco também. Puxa, estou cansado de ser forte, cansado de ser firme, cansado de não me cansar. Aproveito um breve instante para conceder-me o direito de fraquejar um pouco.

Encerro aqui este momento de fraqueza, enxugando as lágrimas e voltando a olhar pra frente, vendo que na verdade tudo não é tão mal assim. Sabe, vejo que perdi muito para em troca ganhar muito mais, por isso vale a pena segurar a saudade pelo tempo que for necessário. Fiz novos amigos, aprendi a ser uma pessoa mais simples, vivo com mais intensidade todas as coisas, vi cenas que me fizeram chorar de felicidade e de comoção... Enfim, vivo coisas novas, o que seguramente vão fazer de mim uma pessoa à altura de tanta gente que deixei para trás.

Amigos, família, todos, saibam que não mais olho para trás para buscar a todos vocês em minha escassa memória. Olho pro lado ou olho pra frente, pois sei que todos estão comigo onde quer que eu esteja e onde quer que eu vá, e que em cada pedalada encurto os caminhos de minha chegada.

segunda-feira, 19 de novembro de 2007

Pequeno desabafo...

Tenho recebido quase que diariamente montões de e-mails de internautas de todo o Brasil. Alguns me xingam de coisas sem sentido, alguns me idolatram por coisas igualmente sem sentido, enfim... Embora sabendo que isso tudo faz parte, confesso que não me acostumei com essa história.

Alguns me pedem conselhos amorosos, profisisonais ou até mesmo me perguntam como fazer para realizar o próprio sonho, como se eu fosse uma espécie de sábio da montanha! Gente, sou apenas uma pessoa comum que resolveu ir atrás de um sonho! Não tenho as respostas, nem mesmo as perguntas. Apenas vivo a vida, simples assim.

O Roda América não é uma religião, não creio em Deus. Imaginem que é uma aventura emocionante ao redor da América, ao redor de mim mesmo. Creio que haja tantas distâncias entre o Brasil e Cuba quanto entre eu e eu mesmo. Gosto de me redescobrir, mas isso não quer dizer que eu seja mais feliz ou mais sábio do que qualquer um! Puxa, é tudo mais simples do que parece.

Galera, não é necessário ir pra onde o Judas perdeu as botas pra se encontrar! Esse é o meu sonho, estes são os meus desafios! Vejo iguais desafios em alguém que abre o próprio negócio, tem uma família feliz e etc. Puxa, se mirem nos próprios exemplos e verão que todos somos sábios, filósofos e grandes aventureiros, cada qual à sua maneira.

Não, não vou fundar uma religião, não criei uma nova forma de ver a vida, não faço idéia do sentido da vida, não sei o que é necesário para viver feliz. Pra dizer a verdade sei de muito poucas coisas, por isso as busco com tanta intensidade. Por favor, não tentem me complicar. Sou apenas um cara simples, sem misticismos, sem filosofias mestras de vida ou qualquer coisa do tipo. Não sou guru de ninguém, nem de mim mesmo.

Já que tanto me perguntam sobre filosofias de vida ou porque faço tudo isso, não tenho respostas muito longas: Sonho, planejo e executo, vivendo intensamente cada uma destas etapas.

domingo, 18 de novembro de 2007

Proposta de emprego em Nova York

Como todos sabem, trabalho em uma empresa americana. Hoje o dono da empresa me ofereceu uma proposta para trabalhar na sede, em Nova York... Um baita salário (baita mesmo), greencard depois de 6 meses e etc. Além do mais, é um trabalho nas terras do papas do marketing, o que seguramente dá uma excelente bagagem em nível global.
Pois é...não aceitei...pois em troca teria que jogar meu sonho fora.
Poucos entendem isso, mas tomei esta decisão com muita segurança. Sabe, saí do Brasil em busca de um grande sonho, não para ficar rico! Puxa, me sinto feliz e plenamente realizado, e isso não é graças ao dinheiro, mas sim ao fato de que estou realizando o meu sonho.
Mãe, pai, família, desculpas...sei que posso ter decepcionado vocês ao deixar de optar por um futuro aparentemente tão promissor, mas sei que vocês conhecem o filho que tem, e por isso sabem que eu não teria outra atitude. Entre o dinheiro e um sonho, fico feliz por ter escolhido a segunda opção, e sei que um dia terão orgulho de mim por ter feito isso...
Sei que receberei vários e-mails, com metade das pessoas dizendo que eu sou um idiota sonhador, outra metade dizendo que isso é super legal e que esta história daria um filme. Sinceramente acho que os dois lados tem razão em parte, mas sempre digo que detesto rótulos. Penso apenas que sou alguém que busca estar bem consigo mesmo, e nada no mundo para essa sensação...


Penso que o separa sonhadores de utopistas é o foco e o esforço constante, por isso sei que consigo chegar onde quero, mesmo que para isso eu perca oportunidades como essa...

quinta-feira, 15 de novembro de 2007

Casa & Vídeo

Sei que normalmente minhas postagens são para descrever aventuras, mas agora faço uma pausa simplesmente para agradecimentos. Amigos, vocês foram e são muito importantes para mim, e espero com esta mensagem retribuir um pouco de tudo o que vocês fizeram por mim.

Fico feliz em ter trabalhado aí com todos. Agora que estou aplicando meus conhecimentos em outros mercados e outras empresas, vejo o quanto o meu aprendizado por essas bandas foi fundamental para mim. Me ensinaram tudo o que eu precisava sem me pedir nada em troca, além de aplicação e pratica depois. Quando eu estava dando consultoria em Uyuni e em Potosí, apliquei muito do que aprendi com vocês sobre como lidar com pessoas, e digo que depois disso me consideraram quase um genio por aquí. É claro que apliquei algunas cositas que eu mesmo criei (depois conto, muitos novos conceitos legais), mas pude conferir de perto o quanto a C&V utiliza ferramentas modernas e perfeitamente aplicáveis ao dia-a-dia. Sim, as politicas de RH da C&V sao bastante avancadas, e agora tenho mais bagagem para afirmar isso com mais propriedade. Puxa, eu estava mais capacitado do que imaginava.

Sabe, vocês mal imaginam o quanto foram e são importantes para mim. Por essas bandas amarelas aprendi muito, vivi feliz, formei grandes amigos…o que mais eu poderia querer? Com certeza seguirei como um pequenino Guerreiro Amarelo pelo mundo, pois o que vivi aí nao sai da pele e da mente tão facilmente.
Não satisfeitos em contribuir comigo por tantos anos, após a minha saída ainda obtive muito carinho de todos! Sempre há alguém perguntando se eu preciso de algo, querendo saber se eu estou bem e etc...Fico mito emocionado com isto, mesmo. Ainda fico me perguntando como posso retribuir a tanta coisa que tenho recebido de vocês.

Amigos, deixo aqui o meu sincero MUITO OBRIGADO!

quarta-feira, 7 de novembro de 2007

Videolog

Todos devem saber que algum , ahn...f'ã...pegou a minha senha do videolog e resolveu apagar todos os meus vídeos. Agora postei tudo de novo, pois tinha feito um backup, mas peco desculpas pelo sumiço temporário dos videos.

Coloco abaixo o texto que fizeram sobre mim (ou sobre o Roda América, sempre me confundo com esses dois personagens. rs) no blog da equipe do Videolog. Nenhum dos fatos decorridos de fato aconteceu (antes que todos mandem mais e-mail preocupados e etc. rs), mas vale pela grande criatividade e boa forma de escrita do autor.

Segue o texto:

É isso que eu falo, é melhor ser um covarde vivo do que um herói morto. Vocês devem lembrar do nosso estimado Ricardo, que decidiu largar tudo e ir passear de bicicleta pela América do Sul, pra voltar e a) escrever um livro de auto-ajuda sobre “meditar pedalando”, b) fundar uma religião ou c) iniciar uma série de palestras sobre o tema “O monge e o ciclista: pra aguentar sete horas sem sair de cima de um selim, só sendo monge mesmo”. Então, ele nos enviava regularmente seus vídeos por terras nunca dantes pedaladas. Porém, o malandro resolveu dar uma passadinha pela Venezuela. Aí a coisa azedou: o William Wallace tupiniquim foi se meter a besta e não só participou como organizou, enchou as bolinhas azuis e brancas e comprou rolos e rolos de serpentina para uma passeata contra o Hugo “foi sem querer querendo” Chavez. E lá já sabe como é, o coro comeu o pau cantou. Botaram o rapaz no pau-de-arara, deram choque em partes menos pudendas de sua nobre anatomia,e ainda confiscaram seus vídeos, o obrigando a retirá-los do nosso site. Porém, sob promessas de não fazer mais piadas com o sobrenome do ditador cucaracha comparando ele com o personagem do SBT, o rapaz foi liberado. Os vídeos haviam sido apagados, maaaas, com bom morador de país que já teve ditadura, ele escondera um DVD com o backup dos vídeos em uma parte, digamos, obscura e de difícil acesso da sua ainda não tão mais nobre anatomia. E depois dessa epopéia, ele está de volta! Dizem por aí que ele agora anda com bottons e camisas pró-Chavez, mas são notícias ainda não confirmadas. Sabe como é, cachorro mordido por cobra tem medo até de linguiça. E ele tá pensando também em comprar um pendrive pequenininho. Deve doer menos pra esconder, caso ele queria dar uma passada em Cuba…



para detalhes, segue o link do blog da equipe do Videolog:
http://videolog.uol.com.br/blog/?user=blog

domingo, 4 de novembro de 2007

Novos rumos da viagem


Agora estou em La Paz, trabalhando numa consultoria americana por 4 meses. Alguns podem pensar que a saga pela América termina por aqui, mas quem me conhece de fato sabe que este é apenas um upgrade do Roda América, ou mais uma gostosa mudança de planos.

Como sabem, fui roubado e perdi todo o dinheiro que havia juntado trabalhando na Bolívia. Com o novo salário, poderei reconstruir minhas finanças para poder seguir em frente. Aconteça o que for, o Roda América segue firme e forte, afinal creio que sonhos existem para serem realizados. O foco não mudou, apenas o meio de chegar até ele.

Aproveitarei esta temporada para aprimorar meu inglês, já que na empresa onde agora trabalho só se fala este idioma. Também precisarei retomar a rotina de treinamentos pesados de musculação e spinning todo dia. Ah, e além de tudo estou aprendendo a tocar gaita, pois é um instrumento fácil de carregar que pode preencher as solitárias noites na estrada.

Um novo emprego, inglês na ponta da língua, mais resistência física, um novo instrumento musical...Me parece que tenho novos desafios por aqui. Novas características, aprendizados e vivências estão sendo adicionadas a este novo Ricardo que se forma a cada dia. Mal vejo a hora de seguir de novo com minha fiel escudeira Capitu, mas dessa vez há uma nova maneira de seguir viagem...

Meu emprego em La Paz


Embora eu estivesse em absoluto desespero por algum emprego, tentei manter a calma para seguir em minha entrevista de emprego. Para quem esperava trabalhar limpando privada, a oportunidade de poder trabalhar com a cabeça, além de tudo numa grande empresa, não me parecia nada mal.


A empresa se chama “Michael Warmack consulting”, é americana e presta serviço ao governo boliviano para o desenvolvimento turístico local. A vaga era para trabalhar como analista de marketing, para construir desde o zero a “marca Bolívia” para os turistas, par enfim melhorar o fraco desempenho turístico do país. Qualquer um que trabalha com marketing de verdade sabe que é um sonho poder construir uma marca do zero, ainda mais se essa marca é um país inteiro!! O emprego que eu sempre quis estava em minha frente, com o agravante de que eu estava prestes a ficar sem dinheiro pra comer, mas mesmo assim eu precisava dar um jeito de mostrar apenas que eu era um bom profissional, e que por isso eles teriam a grande oportunidade de me contratar. Bom, foi exatamente o que eu fiz.

Eu sabia que tinha boas vantagens, pois tinha experiência e formação em marketing e também havia trabalhado para treinar pessoas para turismo em duas cidades do Bolívia, o que fazia de mim um profissional extremamente especializado para a vaga. Além de tudo, a pessoa para quem eu trabalhei em Uyuni era amigo da mulher que me entrevistava, por isso ligou para dar boas referências do meu trabalho. O problema é que eu competia com marketeiros dos Estados Unidos, o que teoricamente me qualificava em uma escola acadêmica menos reconhecida mundialmente, além do que com isso eu era o candidato com o pior inglês. Bateu aquela insegurança, mas felizmente consegui!! A vaga era minha enfim.

De fato até em minhas previsões mais otimistas eu esperava ir tão longe, embora me visse plenamnte capaz para isso. Para os padrões brasileiros, o salário é algo um pouco mais do que mediano, mas faz de mim quase um magnata boliviano. O contrato é de 4 meses, tempo pra juntar dinheiro novamente para seguir viagem.

Entrevista de emprego em La Paz - Como tudo começou


Depois de muito rodar em La Paz em busca de algo, finalmente consigo minha primeira entrevista de emprego na cidade. Tudo começa com mais uma história do fabuloso arquiteto francês Christian, o mesmo que deu o contato com Alberto Granado em Cuba.


Estávamos jantando Christian e eu em Uyuni, quando eu disse que talvez precisasse arrumar emprego em La Paz, o que deu margem para que ele começasse me contar mais uma de suas histórias pela vida afora: Há alguns meses ele estava em um bar em La Paz, quando viu uma moça muito bonita, de mais ou menos 30 anos (lembrando que ele tem 62)sentar-se sozinha. No momento ele já tinha suas famosas duas namoradas de 27 e 31 anos, mas gostava acima de tudo de seduzir, como um típico francês, por isso resolveu se aproximar para contar suas histórias pelo mundo. Depois de finalmente convencer a mulher para que ambos saíssem juntos no dia seguinte, eis que Christian simplesmente falta ao compromisso, sem dizer nada. Bom, onde eu entro nisso tudo? O que passa é que Christian resolveu me usar de bucha de canhão, já que eu precisava de contatos em La Paz e ele precisava sair bem disso tudo. Me disse “ Encontre com ela e diga que minha irmã morreu, por isso tive que tomar um vôo às pressas para Miami, e nem pude avisar nada...”, e dito isso me deu o cartão da moça. Com a cara mais lavada do mundo, foi exatamente o que fiz ao chegar em La Paz.


A mulher, que de fato era muito bonita, ficou super sensibilizada com a morte da irmazinha de Christian, e perguntou quando poderiam se ver de novo, coitada. Junto com o meu recado, me apressei a dizer que havia trabalhado para ele em Uyuni, e que agora procurava algo na cidade. Ela me disse que tinha uma amiga que precisava de um analista de Marketing, e que daria um jeito de marcar uma entrevista de emprego para mim. Acabou que a mulher e eu agora somos bons amigos, o que me levou a não me conter e finalmente desmentir a história que havia contado... Ela acabou rindo muito de tudo, e ainda gostando do entrépido arquiteto devido ao meticuloso estratagema criado somente para não magoá-la! Tá, isso continua sendo uma baita baboseira, mas ao menos agora eu não tinha mais parte nisso.


Entre tantas histórias, eis que finalmente consigo vislumbrar uma saída para meu perrengue em La Paz. Agora é ver no que vai dar...

sábado, 3 de novembro de 2007

Apuros em La Paz...

Inicialmente eu havia dito que haviam apenas roubado meu celular, mas agora posso confessar que disse uma pequenina mentira, apenas para não deixar a todos preocupados. Além do celular, roubaram meu dinheiro, quase todo ele. Não sei como, mas sabia que conseguiria me virar, por isso deixei para dar a notícia apenas quando estivesse com tudo resolvido.


Todo o dinheiro que eu havia juntado trabalhando em Uyuni e Potosi foi por água abaixo. De repente me vi longe de casa, sem amigos, família ou conhecidos por perto, com apenas o equivalente a 50 reais no banco. Digamos que minha atitude inicial não foi exatamente a de um aventureiro destemido, pois eu apenas conseguia sentar no banco de uma praça e chorar feito um bebê, mas precisava recobrar o ânimo em breve... Não gostava da cidade, da gente, mas precisava dar um jeito de me adaptar e superar tudo, pois apenas disso dependia a minha sobrevivência.


No dia seguinte acordei bem cedo para buscar feito um louco algum trabalho. Saí pelas lojas da cidade e também mandei e-mails para todos os meus contatos profissionais da Bolívia, estando plenamente disposto a trabalhar com marketing, treinar mais pessoas, servir café, limpar privada, o que fosse. Amigos, confesso que pela primeira vez na viagem tive medo de não conseguir seguir em frente, pois agora dois dias haviam se passado e eu continuava na estaca zero, sendo que meu dinheiro duraria no máximo por mais 5 dias, com o agravante de aqui em La Paz as coisas são um poucos mais caras e também não se pode acampar. Por alguns dias fiquei no alojamento mais barato que encontrei, mas depois por sorte encontrei um hotel de ingleses que acabava de ser inaugurado, por isso faziam um preço promocional por uma semana de apenas 1 dólar por dia, com direito a café da manhã, salão de jogos e internet. Agora estavam temporariamente resolvidos os meus problemas de alojamento e café da manhã, mas eu ainda precisava descobrir como fazer para obter as outras refeições do dia.


Encontrei no mesmo dia uma brasileira, que como toda nossa gente é muito, mas muito especial mesmo. Ela se chama Neiva, e tem por aqui um restaurante de comida brasileira. Disse que não poderia me dar algum emprego, pois o governo cobrava uma multa alta se ela não empregasse bolivianos, mas que tentaria me ajudar no que pudesse. Disse que eu poderia comer no restaurante dela sempre que precisasse, sem pagar nada. Tá, me ajudar a não passar fome já é uma ação de grande compaixão, que sinceramente me emocionou, mas ela fazia tudo isso com extrema boa vontade e carinho: Além do almoço, me oferecia acompanhamentos, sucos a até mesmo a sobremesa! No final das contas comi no restaurante apenas uma vez, pois respeito o trabalho dela e por isso utilizaria esta opção apenas em última necessidade, mas puxa, que grande mulher eu encontrei no caminho. Brasileiros, brasileiros...Quando eu acho que já os amo o suficiente, eles sempre dão um jeito de me surpreender...


Quando cheguei ao ponto de ter no bolso somente o equivalente a 1 real, digamos que comecei a pensar em atitudes um pouco menos ortodoxas. Passei em frente a um bingo e pensei “opa, vai que a sorte me ajuda!”, pegando algo como 15 centavos pra apostar na máquina caça-níqueis, me sentindo o próprio mocinho em apuros de Holywood. Infelizmente o mundo real é mais duro do que os filmes americanos, por isso o aventureiro aqui se deu mal dessa vez. Agora eu tinha 15 centavos a menos no bolso, que com certeza me fariam falta. Enfim, eu precisava ao menos tentar.


Cheguei pela noite no hotel com cabeça fervilhando de tanto pensar, quando uma idéia não exatamente brilhante, mas a única que eu tive, me apareceu: Meu hotel tinha mesa de sinuca!! Caramba, eu tinha sinuca em casa, por isso poderia ter chance se apostasse com os outros turistas! Acordei no dia seguinte às 6 da manhã e fiquei treinando até o anoitecer, sem parar nem pra comer. Pela noite apostei meus últimos centavos, jogando sinuca como se disso dependesse minha vida. Desta vez as coisas deram mais certo pro meu lado, pois ao final do dia consegui transformar meus centavinhos em algo como 10 reais de novo. Perdi, mas sobretudo venci a quase todas as partidas, e fiz o mesmo no dia seguinte, mais uma vez treinando feito um louco. Amigos, a sobrevivência pode transformar a qualquer um num verdadeiro Rui Chapéu. Minha idéia com a sinuca havia sido bem sucedida, mas eu sabia que era um risco muito grande viver de jogos. Mas enfim, ao menos agora eu ganhava mais tempo pra pensar em mais algo.


As idéias iam acabando, a grana também. Não sei explicar como, mas eu ainda me sentia estranhamente calmo e razoavelmente confiante! Amigos, sabe se lá como, mas as coisas dão certo pra quem corre atrás e tem força de vontade, e estes dois fatores eu sabia que tinha de sobra. Falei com a minha mãe pela internet, mas aí a resistência emocional foi por água abaixo. Eu chorava muito, mas era muito fácil esconder isso sem se falar ou se ver , por mais que eu ache que ela notou que eu tava na merda, ela sempre sabe de tudo, incrível. Não disse que precisava de qualquer coisa, apenas disse que em breve eu poderia ter boas notícias, embora eu não soubesse quais seriam elas.